Por Juan Arias
Extratos do artigo de Juan Arias, correspondente no Brasil do jornal espanhol El País, publicado ali em 18 de fevereiro último.
"Façamos uma ficção literária. Imaginemos que Jesus, aquele profeta
curioso e incômodo, se houvesse mimetizado em um dos cardeais que
entrarão em silêncio na Capela Sistina para a eleição do novo pontífice.
Imaginemos que esse cardeal, sem que os demais soubessem que é Jesus, tivesse um curriculum parecido com o de Jesus.
Vocês crêem que ele seria eleito papa? Temo que não.
(...) Seria eleito um cardeal que como Jesus, ao invés de tratar com
bençãos, favores, gestos diplomáticos a governos e ditadores do momento
lhes dissesse, quando pretendessem intervir nos assuntos da Igreja ou
quando tentassem reprimir a liberdade de expressão no mundo, "ide dizer
que eu seguirei pregando?" Foi assim que Jesus respondeu ao rei Herodes
que pretendia condená-lo ao silêncio.
Seria eleito um cardeal
que tivesse a coragem de dizer: "Dai a Deus o que é de Deus e a Cesar o
que é de Cesar?" O Banco do Vaticano e suas transações em paraísos
fiscais, e as manobras da Cúria para influenciar os parlamentos, são
coisas de Cesar ou de Deus?
(...) Seria eleito um cardeal capaz
de desenterrar aquela passagem terrível de Jesus contra os abusadores
de crianças, para os quais pediu "pena de morte" ao invés de esconder ou
minimizar os escândalos de pedofilia na Igreja que segue defendendo
hipocritamente o celibato obrigatório?
Seria eleito um cardeal
capaz de abrir as portas da Igreja para fieis e infiéis, católicos ou
não, todas as tribos de fé e de ateísmo do mundo porque, como dizia
Jesus, em seu reino cabem todos e todos são igualmente dignos de ser
considerados filhos de Deus?
Seria eleito um cardeal capaz de
anunciar no seu primeiro discurso que todos os teólogos condenados ao
ostracismo por seus antecessores, todas as vítimas da Congregação para a
Doutrina da Fé estariam livres para seguir investigando com liberdade
de espírito o poço inesgotável da verdade revelada?
E, por fim,
seria eleito um cardeal capaz de derrubar as mesas do Templo, de
expulsar dali os que fazem da Igreja um jogo de negócios às vezes tão
sujo que tem provocado suicídios e assassinatos?
A Igreja tem
medo de cardeais jovens. Nomeia a maioria de anciãos. Parece esquecida
que Jesus era "papa", quer dizer, profeta e evangelizador com apenas 30
anos. E que o mataram na flor da vida. E que o poder, tanto religioso
quanto civil, tombou diante dele.
(...) A verdade assusta ao
poder e assusta à Igreja na medida em que ela [a Igreja] se mescla e se
confunde com o poder mundano.
Definitivamente, Jesus teria poucos votos no conclave. Para ele a fumaça seria negra.
Por Juan Arias
Extratos do artigo de Juan Arias, correspondente no Brasil do jornal espanhol El País, publicado ali em 18 de fevereiro último."Façamos uma ficção literária. Imaginemos que Jesus, aquele profeta curioso e incômodo, se houvesse mimetizado em um dos cardeais que entrarão em silêncio na Capela Sistina para a eleição do novo pontífice.
Imaginemos que esse cardeal, sem que os demais soubessem que é Jesus, tivesse um curriculum parecido com o de Jesus.
Vocês crêem que ele seria eleito papa? Temo que não.
(...) Seria eleito um cardeal que como Jesus, ao invés de tratar com bençãos, favores, gestos diplomáticos a governos e ditadores do momento lhes dissesse, quando pretendessem intervir nos assuntos da Igreja ou quando tentassem reprimir a liberdade de expressão no mundo, "ide dizer que eu seguirei pregando?" Foi assim que Jesus respondeu ao rei Herodes que pretendia condená-lo ao silêncio.
Seria eleito um cardeal que tivesse a coragem de dizer: "Dai a Deus o que é de Deus e a Cesar o que é de Cesar?" O Banco do Vaticano e suas transações em paraísos fiscais, e as manobras da Cúria para influenciar os parlamentos, são coisas de Cesar ou de Deus?
(...) Seria eleito um cardeal capaz de desenterrar aquela passagem terrível de Jesus contra os abusadores de crianças, para os quais pediu "pena de morte" ao invés de esconder ou minimizar os escândalos de pedofilia na Igreja que segue defendendo hipocritamente o celibato obrigatório?
Seria eleito um cardeal capaz de abrir as portas da Igreja para fieis e infiéis, católicos ou não, todas as tribos de fé e de ateísmo do mundo porque, como dizia Jesus, em seu reino cabem todos e todos são igualmente dignos de ser considerados filhos de Deus?
Seria eleito um cardeal capaz de anunciar no seu primeiro discurso que todos os teólogos condenados ao ostracismo por seus antecessores, todas as vítimas da Congregação para a Doutrina da Fé estariam livres para seguir investigando com liberdade de espírito o poço inesgotável da verdade revelada?
E, por fim, seria eleito um cardeal capaz de derrubar as mesas do Templo, de expulsar dali os que fazem da Igreja um jogo de negócios às vezes tão sujo que tem provocado suicídios e assassinatos?
A Igreja tem medo de cardeais jovens. Nomeia a maioria de anciãos. Parece esquecida que Jesus era "papa", quer dizer, profeta e evangelizador com apenas 30 anos. E que o mataram na flor da vida. E que o poder, tanto religioso quanto civil, tombou diante dele.
(...) A verdade assusta ao poder e assusta à Igreja na medida em que ela [a Igreja] se mescla e se confunde com o poder mundano.
Definitivamente, Jesus teria poucos votos no conclave. Para ele a fumaça seria negra.
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