Fábio Fabrini e Bruno Boghossian - O Estado de S.Paulo
Delator do esquema de venda de pareceres em órgãos
federais, o ex-auditor Cyonil Borges disse que o presidente do Senado,
José Sarney (PMDB-AP), teria posto sua influência a favor dos interesses
da organização no Tribunal de Contas da União (TCU). Em denúncia
enviada ao Ministério Público Federal (MPF), ele relatou que o
ex-diretor da Agência Nacional de Águas (ANA) Paulo Vieira teria
conseguido alterar a tramitação de processo em favor da empresa Tecondi
após acionar Sarney. O senador nega.
Dida Sampaio/AE
Vieira só foi nomeado como diretor da ANA depois da manobra com Sarney (foto)
De acordo com o inquérito da Operação Porto Seguro, Vieira fazia
lobby no TCU para beneficiar a Tecondi em auditoria que discutia
irregularidades em contrato de arrendamento de áreas do Porto de Santos.
A Polícia Federal sustenta que o ex-diretor ofereceu propina de R$ 300
mil para que Cyonil elaborasse parecer favorável à empresa.
Em 2007, o ex-auditor se manifestou contra a permanência da Tecondi
no terminal paulista. O processo foi remetido ao gabinete do então
relator, Marcos Vinícius Vilaça, hoje aposentado.
Entre 2008 e 2010, Vieira teria operado para que o TCU determinasse
nova inspeção pela Secretaria de Controle Externo (Secex), em São Paulo.
Com isso, haveria a chance de outro parecer, favorável à empresa, ser
elaborado.
Na representação, de 15 de fevereiro de 2011, Cyonil relata conversas
com Vieira, nas quais o ex-diretor teria citado o senador. "Paulo
Vieira disse que pediria a José Sarney, que indicara, à época, o
ministro Vilaça, para reencaminhar o processo à secretaria de São Paulo
e, assim, autorizasse a inspeção." Rejeitado pelo Senado, Vieira só foi
nomeado para a diretoria da ANA após manobra de Sarney.
Vilaça relatou o processo até junho de 2009, quando se aposentou. No
primeiro semestre daquele ano, o ministro enviou o caso a São Paulo para
que técnicos se pronunciassem sobre informações apresentadas pelo
Ministério Público e pela Companhia Docas de São Paulo (Codesp),
responsável pelo porto.
Nova inspeção. O caso voltou a Brasília. Em outubro,
José Múcio assumiu a relatoria e determinou a inspeção em São Paulo.
Pelos registros do TCU, houve nova manifestação da Codesp, o que teria
motivado a remessa para o Estado para avaliar as condições "atualizadas"
do contrato.
A inspeção ficou a cargo de Cyonil, que, segundo a PF, recebeu
propina para elaborar o relatório. No documento, ele muda de posição:
defende a manutenção do contrato com a Tecondi e abre brecha para que a
empresa assuma novas áreas no porto.
Múcio, contudo, não concedeu decisão favorável à empresa. Em abril de
2010, a assessoria do ministro foi procurada por Vieira, que tentou
evitar a remessa do processo para o Ministério Público e cobrou
celeridade no julgamento, com base no parecer de Cyonil. Mas o relator
pediu mais pareceres ao MP e à Secretaria de Desestatização, em
Brasília.
Segundo Cyonil, Vieira teria ficado "transtornado" ao saber que Múcio
proporia medida cautelar contrária à Tecondi, impedindo a ocupação de
novas áreas. A decisão é de novembro de 2010.
No mês seguinte, disse Cyonil, Vieira teria discutido diretamente com
Múcio o "desenrolar do processo". Contudo, o ministro deixou o caso,
alegando motivo de "foro íntimo". "Essa declaração de impedimento pode
ser uma demonstração do ministro de que não concorda com a ideia de
julgar o processo por prováveis motivações políticas ou outros fatos
estranhos ao processo", disse Cyonil.
Ao MPF, o delator contou que o lobby renderia frutos a Vieira, pois
os donos da Tecondi o auxiliariam em campanha a deputado federal, como
revelou o Estado.
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